Contribuição do Babalorixá Baba Dyba de Yemonjá
O Nascimento “ìbí” e o
Batizado “ìsomolórúko ”
Iniciação
A criança de Matriz africana ao nascer, espera-se 09 dias para se
escolher o nome, e o nome “Órúko” deve ter toda uma relação com sua existência
e da família, desde o momento da concepção ao nascimento e o que se espera que
a criança seja e presságios para o devir. O dia que se dá o nome chama-se “Ikómójade”
e a expressão que se usa para o batizado é “ìsomolórúko” e
representa a própria iniciação ou o renascimento mítico para o mundo africano.
Este nome é dado a partir da imantação do “Ori” (cabeça) com Efun
(pemba) e a lavagem com Omi Èrò (água que apazigua) e após a
ingestão de alguns elementos sagrados, como Orógbó ou Obì(sementes africanas), iyò
(sal), oyin (mel) e Ataare (pimenta da costa), Epo-pupa (azeite de dendê) e Omi
(água) da quartinha. No processo de ìsomolórúko escolhe-se bàbá ìsàmì (Padrinho) ou Íya Ìsàmì (Madrinha) que já
estejam num estágio avançado de iniciação e acumulo de conhecimentos e possam
estar contribuindo no processo de formação do noviço ao longo da vida dele.
O “Ígbeyàwó “
Casamento
O casamento de matriz africana segundo Félix Ayoh’Omidire em sua obra
“Àkògbádùn” é o maior de todos os ritos, pois é o único rito que a
pessoa tem a oportunidade de escolher e de vivenciar plenamente, já que o
“ìsomolórúko” se faz quando ainda é neném sem consciência e o “ Ìsìnkú”
(enterro) quando já está sem vida. O ígbeyàwó não é somente união de duas
pessoas mas um contrato entre duas famílias: a do noivo e da noiva, é um
processo complexo que nas antiguidade Yorubá se concluía em até quinze anos,
hoje já mais simplificada. No Brasil através da Religião de Matriz africana se
reproduz um ensaio do que realmente o é. Pouquíssimos são os terreiros que
realizam estes ritos por conta do sincretismo e quando o fazem acabam
reproduzindo o que o Padre faz na Igreja e não obedecendo o rituais que manda a
tradição. Para a celebração do Ìgbeyàwó utiliza-se os mesmos elementos
utilizados para o “ìsomolórúko” acrescentando o vinho de palma, a cana de
açúcar , Peixe defumado e inhame que devem ser ingeridos por ambos. Após O
Babalòrìsá ou a Iyalòrìsá proferem as devidas palavras sagradas e
cânticos enquanto um casal mais velho unido dentro do mesmo preceito faz o
papel de padrinho e Madrinha lavando e secando os pés dos noivos com Omi Èrò,
após entre cânticos para os Òrìsá’s apresenta-se ambos ao “Egbé”
(comunidade), dando por encerrada a cerimonia.
Iku
a Morte
Esta é uma grande oportunidade de esclarecer os adeptos da Religião
Afro sobre os procedimentos escatológicos (Arisun, Ásèsè, Sirrun), ou
seja despojos finais, e a relação com Iku (a Morte).
Para a maioria dos adeptos a Morte é tida
como uma perda e a partir da Morte tudo que era do falecido tem que ser
despachado e a sensação que dá que o povo quer esquecer tudo o que ele foi ou
representou para comunidade durante os anos de vida e de dedicação. Pouco se
guarda, e a impressão é que se tenta matar a memória, e isto é uma
contrariedade na visão de mundo Africana. Morrer é retornar para casa, é
retornar à massa de origem segundo mito de “Iku”:
Conta o mito que Olódùmarè, ao decidir criar o ser
humano, designou essa incumbência Òsálá,
que teve a necessidade de obter o material adequado para aquele
propósito. Ao experimentar diversos elementos, o que pareceu apropriado para
que o ser humano fosse moldado seria amó (o barro) formado pela mistura de terra e água. Então, Òsálá que fora incumbido
daquela tarefa por Olódùmarè, ordenou a Èsù o mensageiro, que fosse
buscar um pouco de lama para que Ele pudesse executar sua tarefa.
Como era corrente e
sabido por todos, não havia nada que Èsù
não pudesse realizar, e a tarefa parecia fácil. Porém, ao chegar ao
local, quando Èsù meteu a
mão na lama arrancando-a do Ilè (solo), a lama chorou porque estavam
arrancando parte dela, e se isto fosse feito em grande quantidade ela poderia
acabar. Èsù ficou tocado
com a reação da Lama e retornou sem a porção e relatou a Òsálá o acontecido.
Òsálá então chamou Ògún, este sim, guerreiro intrépido e destemido, resolveria aquele
pequeno problema. Ògún lá chegando, ao retirar a lama para colocar em sua capanga
(bolsa), esta caiu em prantos lamentando-se. Ògún também ficou sensibilizado, também voltou a Òsálá
sem que houvesse cumprido a missão.
Assim, um a um, cada Òrìsà que foi incumbido para a missão,
voltava com a mesma desculpa.
Foi quando Òsálá chamou Iku, deu-lhe a capanga e mandou-o para
executar a tarefa uma vez que os demais não conseguiram levar a termo. Então Iku, ao chegar ao local, começou a
retirar a lama do ilè, e ela chorou. Ikú
então perguntou a Lama o por que do
pranto e a lama justificou. Iku
compreendendo a razão da tristeza fez um pacto com a lama de que de tempo em
tempo sua matéria seria restituída, ficando determinado que para que novos
seres pudessem nascer, outros precisariam morrer, voltar à massa de origem para
recompô-la e possibilitar novos nascimentos. Iku retorna a Òsálá com a sua
missão cumprida.
Com a matéria prima em mãos Òsálá molda os
seres humanos e após insufla seu hálito para lhes dar a vida (Èmi).
Ìsìnkú (Ritual de
Enterro), e o Ásèsè (origem da origem)
Ao morrer todos os iniciados na Matriz Africana retornam para casa, ou
à massa de origem. A complexidade do indivíduo de matriz africana define-se
como uma tríade formada pelo Ara (corpo), Òrìsá, e Eégún (espírito) e cada um
deve ser restituído à sua origem. O ara retorna ao Ilé, o Òrìsá retorna
às forças da natureza e o Eégún retorna à Òrun (Espaço divinatório) ao
quais oferece 9 possibilidade que variam de Òrun Àlàáfíà (paz, coisas boas) à Òrun
Burúkú (que se opõe ao bem) de acordo com o cumprimento ou não do Projeto
Mítico Social que é o comprometimento de todos que professam a tradição.
Para que sejam restituídos os elementos aos devidos espaços se fazem
necessários diversos ritos escatológicos entre eles o Ìsìnkú e o Ásèsè.
O primeiro é o que chamamos de “Arissum” no Batuque que entendemos ser uma
corruptela da Conjunção de Ara(corpo) Òsùn(dormir) ou seja o corpo que dorme,
quando é feito todos o procedimentos de desligamento do Ara e Eégún ao
arrebentar a guia e depositar o Borí junto ao corpo, ou “quebrar”, no sentido
de desindividualizar de acordo com algumas tradições, que tem o sentido de
desfazer e ao mesmo tempo restituir ao coletivo. A partir daí os cânticos que
se seguem dando conta da nova condição do falecido.
Ao sétimo dia Iniciam-se a cerimonia de Ásèsè que é chamada de
“missa de sétimo Dia” mas que vai muito além disto, pois inicia no sétimo dia e
se estende por 03 anos sendo que incialmente dependendo do tempo iniciático é
feita de 7º dia, um mês, três meses, seis meses e um ano, sendo que para outros
rituais os tambores ficam silenciados por um ano, compreendendo-se como um
tempo de “luto”, porém um tempo de introspecção e reflexão para o Egbé
(comunidade), já que o retorno à massa de origem representa o fortalecimento do
àse coletivo e por isso deve ser comemorado e isso se reproduz no Ásèsè
quando se come e se bebe tudo que o falecido gostava e se lembra os seus feitos
e se chora de saudades. Lembrar dos seus feitos na visão de mundo Africana
compreende em jamais esquecer em manter viva a memória coletiva, pois ninguém
deve ser esquecido. No Ásèsè as imolações são feita no Ilè (chão), num
espaço existente no terreiro que denominamos Balè que presume-se da conjunção
da palavra Ebo(oferenda)
Ilè ( chão, terra) ou seja dar de comer a terra ou o ato de abrir a
terra para receber sua origem. Todos os animais imolados são servidos no outro
dia aos participantes da celebração, onde se serve o arroz com galinha e o
restante do Ajeun(comida). O ritual se encerra após a limpeza e após a
conclusão do Erù (carrego) que consiste entre outros elementos o
desfazimento dos assentamentos do falecido quebrando, coletivizando os mesmos,
o carrego é levado para o Rio.
Púpò gbogbo àse
Baba Diba de Iyemonja
Coordenador estadual da RENAFRO-SAUDE-RS – Rede Nacional de Religião
Afro e Saúde
Babalorisa do Ile Axé Iyemonja Omi Olodo
Vice Presidente do Africanamente Centro de Pesquisa Resgate e
Preservação de Tradições Afrodescendentes
Fontes:
-AYOH’OMIDIRE, Felix
1967 – Akogbadun: abc da língua, cultura
e civilização iorubanas – Salvador - EDUFBA: CEAO,2004
-NAPOLEÃO, Eduardo –
Vocabulário Yorubá - Rio de Janeiro –
Pallas, 2010.
- SANTOS, Juana Albein
– Os Nago e a Morte – Petropolis – Vozes - 1975
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